quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Carlos Dummond de Andrade - Tristeza do Império - 05/28

Neste poema tomamos a situação temporal entre os anos de 1822 a 1889, data referente aos anos do Império no Brasil. O Império brasileiro, embora monarquico e intimamente ligado a família real portuguesa, foi o primeiro governo brasileiro propriamente dito, nele o país faz suas primeiras dividas externas e travou suas guerras.
Os governos monarquicos, primeiro e segundo império, foram marcados por muito conturbação político-sociais, Guerra da Cisplatina, Confederação do Equador, Abdicação de D. Pedro I, Regência Trina, Regência Una, Cabangem, Sabinada, Farroupilha, Maioridade, Segundo Império, Guerra do Paraguai4, Extinção do Tráfico Negreiro, Abolicionismo5, Abolição da Escravatura, Início de um processo de urbanização6, tudo isso no espaço de pouco mais de 65 anos.
O poeta trata, neste poema, da coisa que se espera.


A elite do Império (“conselheiros angustiados”) enfrentava alguns problemas: “guerra do Paraguai”: embate ocorrido entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai no século XIX;
“enfado bolorento de São Cristóvão”: interpretado como sentimento desagradável causado pela obsolescência (decadência) do Império, esse último substituído pelo termo “São Cristóvão” através do recurso de uma figura de linguagem - Sinédoque, tipo de metonímia que substitui a parte pelo todo. Isso ocorre devido ao fato de que o Palácio Imperial localizava-se no bairro de São Cristóvão, e era também chamado Paço Imperial de São Cristóvão, ou somente, Palácio de São Cristóvão, hoje conhecido por Quinta da Boa Vista, parque urbano;
“a dor cada vez mais forte dos negros”: Ao longo do Segundo Império o movimento abolicionista ganha força e concretizou, paulatinamente, diversas leis que alteravam a condição dos escravos. Culminando na Lei Áurea.;

Para esquecer esses problemas a elite usava da cantiga tocada pelas moças como visto em: "bus-co a cam-pi-na se-re-na/ pa-ra li-vre sus-pi-rar",  versos de cantiga de um compositor brasileiro da época Imperial - Cândido Ignácio da Silva e “ante o colo ebúrneo/ das donzelas opulentas/ que ao piano abemolavam”.
Essa elite, enquanto “sorvendo mecânicos uma pitada de rapé”, ou seja, enquanto absorve lentamente seu tabaco moído rotineiro, sonha com “a futura libertação dos instintos/ e ninhos de amor a serem instalados nos arranha-céus de Copacabana, com rádio e telefone automático”, ou seja, a modernidade acompanhada de desejos. O sentimento dos que esperam melhoras para seus dias. O sentimento de quem espera.


Tristeza do Império

Os conselheiros angustiados
ante o colo ebúrneo¹
das donzelas opulentas²
que ao piano abemolavam³
"bus-co a cam-pi-na se-re-na
pa-ra li-vre sus-pi-rar",
esqueciam a guerra do Paraguai4,
o enfado bolorento de São Cristóvão,
a dor cada vez mais forte dos negros5
e sorvendo mecânicos
uma pitada de rapé6,
sonhavam a futura libertação dos instintos
e ninhos de amor a serem instalados nos arranha-céus6 de
             [Copacabana, com rádio e telefone automático.




¹ Ebúrneo caracteriza a moça pela sua semelhança ao marfim, pressupondo, portanto, que a moça possuia a pele num tom branco com uma diminuta porção de amarelo.
² Opulentas: magníficos, ricos.
³ Abemolavam significa voz ou tom que se abaixa, oriunda de bemol (música) que abaixa o tom das notas.
6 Rapé: tabaco em pó para cheirar, muito comum à elite do Império



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